Amigos do Fingidor

segunda-feira, 7 de setembro de 2009

Benchimol e os judeus na Amazônia
Tenório Telles
Samuel Benchimol (13/07/1923-05/07/2002).

A história da civilização tem sido a expressão da luta, do sacrifício e realizações de povos e, em especial, de seres humanos que, pela força do caráter e dos valores que cultivaram, fizeram a diferença na trajetória da humanidade. O povo judeu é um exemplo desse vigor, perseverança e capacidade de superação. Por isso foi capaz de sobreviver aos banimentos, violências e tragédias que lhe marcaram o percurso.

O acontecimento mais expressivo da história desse povo no último século, que lhe assegurou o direito à existência como pátria independente, foi a criação do Estado de Israel, em 1948. Marco do retorno das legiões de deserdados para a terra-mãe, metáfora da luta de Moisés para chegar a Canaã. Um ano após a restauração do Estado de Israel, realizou-se em Manaus um evento comemorativo ao primeiro aniversário de Eretz Israel. O discurso de saudação coube a um jovem que, anos mais tarde, viria a ser um dos orgulhos de sua gente e um dos intelectuais mais importantes da Amazônia. Na condição de presidente do Grêmio Cultural e Recreativo Sion, Samuel Benchimol proferiu uma comovente oração celebrando seu povo.

As palavras proferidas naquele longínquo 15 de maio de 1949 já denunciavam o talento e a força intelectual de mestre Benchimol. Depreende-se da leitura do texto, a intensidade, a emoção e a clarividência expressas em cada frase. Demonstrava profundo conhecimento do significado histórico daquele momento: “É um Estado assim que renasceu para acolher homens, mulheres, velhos e crianças inocentes, vazios de estômago, mas cheios de fé, vazios de conforto, mas cheios de esperança, sem passaporte na mão, a não ser a velha Bíblia de Moisés. A velha Bíblia que os conservou unidos nestes dois milênios, que os fez afinal regressar à velha Sion...”

Sessenta anos se passaram. O professor Benchimol já não está entre nós, mas permanece vivo na memória de seus familiares, amigos e, especialmente, de seus alunos. Hoje, a comunidade judaica amazonense está em festa para celebrar seis décadas de restauração da pátria dos filhos de Abraão. Um dos acontecimentos que marcam esse evento é o lançamento da terceira edição do livro Eretz Amazônia – os judeus na Amazônia, uma das obras mais importantes do pensamento regional e um tributo de Benchimol à memória das famílias judaicas que se estabeleceram na pátria das águas. Eretz Amazônia é um livro profundamente humano, estruturado como um vitral evocativo da saga dos judeus que, depois de séculos de perseguições na península Ibérica e Marrocos, estabelecem-se na Amazônia, a nova Terra da Promissão.

Eretz Amazônia é um livro especial: feito de vida, sonhos, sofrimentos e esperança. Retrata a saga dos judeus nas terras amazônicas – a nova terra da promissão de milhares de homens e mulheres que vieram para a Amazônia, onde reconstruíram suas vidas e contribuíram com seus talentos para o desenvolvimento regional. Com essa obra, como ocorreu em 1949, o professor Samuel Benchimol está vivo nas comemorações aos 60 anos de restauração do Estado de Israel – pátria dos filhos de Abraão, renascida para acolher os expatriados, os desterrados e os sonhadores que lutaram para realizar em nosso tempo o sonho de Moisés – de uma terra acolhedora e livre. A Amazônia é a Eretz dos judeus que aqui se enraizaram e se fizeram caboclos.

Capa da 3ª edição de Eretz Amazônia.