Infância
Dori Carvalho
jamais
esquecerei
o irmão que
matou o irmão
e todos
perguntavam
se lavaram
o sangue do chão
jamais
esquecerei
o pai
passando susto no menino
e o medo
das águas revoltas
lagrimando
nos olhos pequeninos
jamais
esquecerei
o
pé-de-ferro, o sapato, o martelo
e o silvo
do pássaro-preto
alegrando o
trabalho do velho
jamais
esquecerei
o menino
que namorava a menina
e na
distância nem sabia
estar
gravada nas tímidas retinas
jamais
esquecerei
a velha e
boa senhora
lavando
roupa, fazendo comida
pronta para
os filhos a toda hora
jamais
esquecerei
o papagaio
cortando os ares
e aquela
mão desconhecida
partindo
sonhos estelares
jamais
esquecerei
as pequenas
mãos apavoradas
na escuridão
daqueles tempos
queimando
livros na madrugada
jamais
esquecerei