João
Bosco Botelho
A
crença no poder mágico da fumaça, produzida pela açäo do fogo em alguns
vegetais, foi uma constante, desde
tempos imemoriais, no universo mítico de muitas sociedades.
Especificamente
sobre o fogo, é possível que a atençäo comum tenha sido despertada pelo
amorfismo incontrolável. De maneira diversa dos elementos materiais com formas
domáveis, o fogo amorfo, por si só, impedia qualquer contato manual. O produto da combustäo, a
fumaça, de igual modo mantinha a imprevisibilidade da forma; ao contrário do
fogo, era passível de ser possuída por quem a aspirasse.
Os
relatos dos cronistas no Brasil colônia, muitos acompanhados de icnogravuras,
narraram o uso do tabaco nos ritos terapêuticos e divinatórios. Os pajés se
comunicavam com os espíritos, para
curar e adivinhar, através da força embriagadora da fumaça do tabaco queimado.
A
passagem do tabagismo do espaço sagrado para o profano se deu, no Brasil, com
a chegada do colonizador. O vício de fumar como instrumento de prazer foi
assinalado por Cardim, no século 16: “Costumam
esses gentios beber fumo de petigma (tabaco) por, outro nome erva santa... fica
como canudo de cana cheio desta herva, e pondo‑lhe fogo na ponta metem o pau
grosso na boca e assim chupando e bebendo aquele fumo, e o tem por grande mimo
e regalio”.
Durante
a ocupaçäo holandesa, do Nordeste brasileiro, na primeira metade do séuclo 17,
pelas tropas de Joäo Maurício de Nassau, o médico Guilherme Piso, chefe dos
serviços médicos das Indias Ocidentais, registrou: “A célebre erva Tabaco ou Petum, chamada pelos brasileiros Petume, em
quase todas as Indias Ocidentais é, desde remotos tempos, estimada pelos
próprios íncolas para sarar feridas. Logo que os europeus souberam disto,
pesquisando‑lhe as virtudes recônditas, aplicaram as folhas frescas, bem como o
sumo das mesmas, a usos humanos; depois secas, nos abusos e prazeres também. De
sorte que agora, como o vento hibernal, o fumo do tabaco vicia o orbe universal”
.
O
consumo, em 1920, quase nulo no sexo feminino, alcançou a fantástica cifra, em
1970, de duas mil unidades por adulto.
A
atenção das autoridades mundiais de saúde pública foi alertada, pela primeira
vez, pelo Relatório de Hammond e Horn, em 1954, financiado pelo American Cancer
Society, seguido pelo do Royal College of Phisicians, da Inglaterra, em 1962, descrevendo
a gravidade do tabagismo.
Nos
anos 1965, a comunidade científica percebeu a brutal mudança nas incidências dos
cânceres, todos ligados ao tabagismo: boca, laringe, pulmäo e bexiga.
A
patir dos anos 1970, muitos países iniciaram de forma coordenada o combate ao tabagismo.
O mundo conseguiu, trinta anos depois, postar o fumante como alguém desprezível.
O
Brasil é reconhecido mundialmente como um exemplo na luta contra o tabagismo.
Independete
das crenças políticas, ideológicas e religiosas, o mundo está unido contra o
tabagismo.