O tacape do Bacellar
Marco Adolfs
Sábado, dez horas da manhã. Dia de mais um lançamento da livraria Valer. Espaço apinhado, câmeras, olhos, caras e bocas. Literatura também é feita de comparecimentos sociais e discursos elaborados. Sentei ao lado do Bacellar e começamos a falar sobre literatura. O mote era o livro do escritor catalão Enrique Vila-Matas que eu havia lhe emprestado.
– Estou gostando muito do livro! Muito bom! – comentou o poeta, saindo de seu mutismo.
O livro que o Bacellar elogiava era O Mal de Montano.
Ao nosso redor, parte da intelectualidade do Amazonas circulava, alheia às nossas conversas.
Ando encontrando o Bacellar sempre sentado naquele canto esquerdo de quem entra na livraria. E ali conversamos sobre o mundo.
Outro dia, estava na livraria a ler um livreco do Paul Auster, O Caderno Vermelho, quando o bardo entrou porta de vidro adentro e sentou-se ao meu lado.
– É a glândula pineal que emite sua energia etérea para nos encontrarmos –disse o Bacellar, face às coincidências de nossos encontros.
Falamos de Ana Petrovna Blavatsky, dos monges do Tibet e da poesia do abacaxi que é um sol.
Foi quando ele chamou o Nivaldo, um dos vendedores da livraria.
– Nivaldo! Venha cá, por favor!
– Pois não, seu Bacellar – disse o Nivaldo, olhando-nos desconfiado.
– Por acaso tu podes me arranjar um pedaço de boa madeira? De um metro e meio, mais ou menos?
– Mas para quê, seu Bacellar? – perguntou o Nivaldo, rindo.
Aí eu me intrometi.
– Sabe o que é Nivaldo – comecei a explicar – O Bacellar está a fim de fazer um tacape para abater alguém ligado à literatura do Amazonas.
O Nivaldo arregalou os olhos e se assustou. E eu continuei.
– ...Desde a semana passada que ele está com essa ideia fixa de confeccionar um tacape e abater essa pessoa – observei, sabedor da estória do Bacellar. Não sei quem será o infeliz! – completei curioso.
Rimos todos.
– O pior é se ele resolver abater outros e acabar virando um serial killer de literatos amazonenses – disse ainda, para mais uma gargalhada geral.
Porém, pensei... Devo acreditar que esse tacape do Bacellar seja apenas uma arma simbólica. De alguém que deseja somente acordar um ou outro literato, com uma pancada metafísica na cabeça.